Na China, mais precisamente no sul, há uma província chamada Cantão, que é uma área costeira, por isso o acesso ao mar era mais fácil para os cantoneses (habitantes de Cantão) que para outras regiões da China. Com isso muitos cantoneses saiam em busca de melhores condições de vida e trabalho, indo para América, África e Europa.
Os imigrantes chineses trabalhavam como operários, lavradores, cozinheiros etc. Na sua vida diária sempre arranjavam um tempo para praticar suas técnicas de Kung Fu que haviam aprendido na China. A maioria dos chineses tem uma estrutura física franzina e se vestiam com roupas tradicionais chinesas e por isso eram freqüentemente provocados para brigas e na maioria das vezes venciam lutas contra homens muito maiores e mais fortes e todos ficavam curiosos de como estes homens tão pequenos podiam vencer adversários com o dobro de seu tamanho.
A língua chinesa é muito complicada sendo entendida apenas pelos próprios chineses, então quando as pessoas perguntavam que técnica era esta em que homens pequenos podiam vencer outros com o dobro do tamanho, os chineses com o vocabulário muito limitado, tentavam explicar e acabavam dizendo simplesmente: “É Kung Fu”, e as pessoas achavam que este era o nome da técnica de luta usada pelos chineses, quando na verdade “Kung Fu”, literalmente, significa “Trabalho intenso” ou “Trabalho árduo para ficar bom nisso”, ou seja, os chineses queriam dizer que para conseguir ficar bom nessas técnicas deveria se dedicar algumas horas do dia para praticá-las.
É algo muito complexo quando se vai falar sobre a real origem do Wushu, esta arte marcial que a milhares de anos está agregada à cultura chinesa e que vem crescendo a cada dia.
Uma de suas possíveis origens e provavelmente a mais correta pode ser encontrada na pré-história, onde os ancestrais do então povo chinês eram obrigados a lutar contra animais selvagens e outros homens a fim de garantir sua sobrevivência. No curso dos anos, eles vieram a compreender que, para derrotar o inimigo, deveriam não ter apenas boas armas, mas também melhorar sua capacidade de combate, através de intensivo treinamento nos tempos de paz. Isto levou ao desenvolvimento de diversas artes de guerra ao longo dos séculos.
Segundo tradições históricas, Huang Ti, o legendário Imperador Amarelo, criou as técnicas de arte marcial para combater Chi You, um ente que simbolizava a violência e a desordem universal. Era a época que os soberanos míticos governavam a China. Os estudiosos situam este período entre 4.000 a 2.000 a.C. Mas não podemos atribuir a uma pessoa a origem de uma arte marcial tão complexa como o Wushu.
Os guerreiros de Chy You, que travaram memoráveis batalhas contra o Imperador Amarelo, Huang Ti, criaram um tipo de exercício militar denominado “Jiadi”, no qual os contendores lutavam utilizando capacetes com chifres, da tribo Chi You. Outro tipo de disputa muito conhecido era o “Ganquiwu”, onde os lutadores utilizavam um machado em uma das mãos e um escudo na outra.
Na dinastia Zhou (Séc. XI – 221 a.C.), a luta livre era considerada um esporte militar, juntamente com o arco e flecha e a corrida de carruagens. O uso da espada também era muito popular naquele tempo. O próprio Imperador Zhou Wen, que governou o reinado de em 298 a.C. era tão fascinado com a habilidade no manejo da espada, que mantinha em sua corte 3000 convidados que competiam dia e noite, a fim de ver quem era o mais hábil no uso da espada. O povo chinês sempre foi possuidor de um grande espírito guerreiro que fez de seu país, em épocas passadas (Dinastia Shang – 1766 a 1122 a.C.), o país mais poderoso da Terra.
Segundo historiadores, esse poderio militar se desenvolveu graças às invasões estrangeiras e as revoluções entre senhores feudais e os imperadores chineses.
Naquela época, a imensidão do território chinês era disputada pelos cobiçosos monarcas bárbaros que habitavam as terras vizinhas.
Como levavam semanas e até meses para deslocar as tropas imperiais para defender as longínquas fronteiras, a família imperial usou o recurso desesperado de delegar poderes aos nobres da corte. Esses nobres, que passaram a ser conhecidos como senhores feudais, receberam imensas porções de terras, semelhantes aos condados outorgados à nobreza na Inglaterra medieval. Dessa forma passaram a receber grande parte das riquezas produzidas por seus vassalos e metade das colheitas e das extrações minerais, mas eram obrigados a defender suas terras e a vida de seus súditos com seus próprios recursos.
Os senhores feudais se viam obrigados a sustentar imensos exércitos que, em tempos de paz se dedicavam intensamente às técnicas marciais. Por volta dos séculos II e III, aconteceram grandes batalhas internas entre os senhores feudais que desejavam ampliar seus domínios. Essa época, denominada “Período dos Reinos Combatentes” (450 – 221 a.C.), fez com que milhares de homens se enfrentassem , e as crônicas da época relatam formidáveis batalhas que terminavam com a morte de 70, 80 e até 400 mil homens. Os vencedores não admitiam sobreviventes e aqueles que não pereciam no ardor da batalha eram sumariamente decapitados.
No Período dos Reinos Combatentes, surgiram numerosas estratégias que enfatizavam a importância do Wushu para a formação de um exército verdadeiramente forte. Sun Tzu o autor do mais antigo livro existente sobre “a arte da guerra”, assinala que “os melhores de combate contribuem para o fortalecimento do estado físico dos soldados”.
Na dinastia Han posterior (25 – 220 d.C.), um médico famoso chamado Hua Tuo (falecido em 208 d.C.) criou uma seqüência de exercícios para a saúde que imitavam os movimentos do tigre, do cervo, do urso, do macaco e do pássaro, conhecido como “Wu Quinxi” (O Jogo dos Cinco Animais), estas séries auxiliavam a tornar flexível o corpo e a estimular o apetite. Wu Pu, um discípulo de Hua certa vez disse: “Para ter dentes sadios, visão e audição excelentes mesmo aos 80 anos, pratique o Wu Quinxi”. Outro discípulo de Hua, chamado Fan A, viveu mais de 100 anos. O trabalho de Hua teve profunda influência nos exercícios direcionados para a saúde na China, o “Império do meio” ou “País do centro do mundo”, nos anos posteriores.
Na dinastia Jin (265 – 420 d.C.) o Wushu recebeu influência do budismo e do taoísmo. Ge Hong (284 – 364 d.C.), famoso médico e filósofo taoísta, integrou o “Chi Kung” (trabalho da energia interna), importante ramificação da medicina chinesa tradicional, ao Wushu. Suas teorias em relação à ação externa (Yang) e interna (Yin) no Wushu são universalmente conhecidas até em nossos dias. O sistema de exame da corte, iniciado na dinastia Tang (618 – 907 d.C.) deu um forte impulso ao desenvolvimento do Wushu. Todos os oficiais e soldados deveriam passar por testes de artes marciais, antes de serem promovidos. Títulos honrosos como “Guerreiro de coragem” e “Guerreiro de agilidade” eram conferidos a destacados mestres de Wushu.
Na dinastia Song (960 – 1279 d.C.), organizou-se uma série de associações de Wushu. Neste período, os peritos de Wushu faziam demonstrações de rua. Em seus repertórios contavam espada contra escudo, lança contra escudo, além de seqüências de movimentos e suas aplicações.
Na dinastia Ming (1368 – 1644 d.C.), o Wushu prosperou como nunca. Qi Ji Quang, ilustre general, escreveu um livro que tratava de 16 diferentes estilos e formas com mãos livres e outros 40 com lanças, espadas e bastões. Este livro possuía explicações detalhadas e inúmeras ilustrações. O general Qi formulou também uma série de teorias e métodos de treinamento, que muito contribuiu para o desenvolvimento do Wushu.
Durante a dinastia Qing (1644 – 1911 d.C.), apesar de um decreto imperial que proibia a prática do Wushu entre o povo, para que em uma suposta revolta não tivessem capacidade de enfrentar o exército imperial, estabeleceu-se uma grande quantidade de sociedades secretas dedicadas à divulgação da arte.
Com a proclamação da República Popular da China, em 1912, as artes marciais foram ensinadas em todo o país e adquiriram grande prestígio. Em 1949, o líder Mao Tse Tung tomou o poder e muitos mestres de Wushu, por motivos políticos, emigraram para Taiwan (Formosa) ou para Hong Kong, protetorado britânico na época.
Atualmente, na China continental, o Wushu tem recebido característi-cas desportivas, onde o aspecto competitivo é altamente enfatizado. Em Taiwan e em Hong Kong, a prática tradicional tem sido mantida em grande escala. Observa-se uma presença maior dos estilos do norte da China como Tai Chi Chuan, Shuai Chiao, Chang Chuan, Pakua e outros em Formosa, enquanto que na colônia britânica, nota-se uma predominância dos estilos do sul como Choy Li Fut, Wing Chun, Hung Gar e outros.
A China, mais que qualquer outro país do mundo, situa-se numa posição geográfica de isolamento total. Isolada ao norte pelas amplidões dos desertos da Manchúria e da Mongólia, e para além deles a imensidão gelada da Sibéria; a nordeste pelo Himalaia que vai até o sul e sudeste e a leste pelo oceano Pacífico, os chineses foram forçados a desenvolver sua própria cultura, sem influências do mundo exterior. Os antigos chineses souberam, como nenhum outro povo, deduzir dos fenômenos da natureza certas leis e princípios que passaram a fazer parte de uma filosofia de vida e de uma sabedoria excepcionais. As diferentes escolas de Wushu receberam na China uma divisão empírica, que as denomina como Escolas do Norte e Escolas do Sul. Essa denominação surgiu devido ao fator geográfico que influenciou no desenvolvimento dos estilos básicos.
Graças à grande extensão do território chinês, suas regiões do norte e do sul caracterizavam-se por marcantes diferenças no que tange ao solo e aos acidentes geográficos. Daí surgir o conceito “Na Kuen Pat Tui”, que em chinês significa: “Punhos no Sul, pernas no Norte”. Os povos do norte habitavam as montanhas, e, portanto, tinham pernas fortes e se especializaram no desenvolvimento de estilos que fossem favoráveis ao uso dessa predisposição natural.
Os povos do sul habitavam os pântanos, nas várzeas onde semeavam o arroz e nas barcas atracadas às margens dos rios. Por força dessas circunstâncias precisavam manter o equilíbrio de forma precária e se tornaram exímios cultores dos estilos em que predominava o uso dos braços. Além da influência geográfica que acabamos de examinar, o Wushu se desenvolveu sob as características das religiões e filosofias mais marcantes de sua cultura.
No início da Era Cristã as escolas budistas originárias da Índia tiveram grande ascensão dentro da civilização chinesa, passando a ter certa influência política. Os líderes do Budismo chinês eram agraciados pelo imperador com cargos públicos.Esses fatos perturbaram muito os praticantes da filosofia taoísta, criada por Lao Tsu, que se viram na contingência de transformar sua filosofia em religião em busca do prestígio que tinham perdido. Essa transformação do Taoísmo em religião foi tão radical que, para concorrer com as divindades budistas, foram instituídos os “Imortais”, que eram semideuses taoístas.Desses imortais, os mais famosos foram os “Oito Imortais Bêbados”, que deram origem ao estilo “Chui Pa Hsien”, mais conhecido como “Estilo dos Bêbados”.
Para diferenciar as escolas de Wushu de origem taoísta das de origem budista, foram criados os termos “Nei Chia” (escola interna) e “Wai Chia” (escola externa).
As escolas taoístas (internas) caracterizam-se pelos movimentos lentos, pela respiração profunda e pelo estudo das energias internas – exemplo: o Tai Chi Chuan. As escolas budistas (externas) caracterizam-se pelos movimentos rápidos e agressivos e pela busca de praticidade em situações de luta – exemplo: o “Shao Lin”.
Na época da Dinastia Chou, os homens estavam cansados das guerras e revoluções que esfacelavam o império chinês. Muitos desses homens foram para os bosques e montanhas buscando refúgio na vida solitária e na convivência com a natureza. Esses ermitãos professavam a filosofia do “Tao” (caminho), daí serem conhecidos como taoístas. Esse conceito denominado “Tao” não pertence aos taoístas, tendo surgido no alvorecer da civilização chinesa e sendo atribuído ao filósofo Fu Hi.
O conceito original foi ampliado através dos ensinamentos de Lao Tsu (também conhecido por Lao Tse, Lao Zi ou Li Ehr, segundo diferentes dialetos).
As escolas taoístas passaram no decorrer da história por três etapas sucessivas e independentes: A fase filosófica (Tao Kia), a fase mágica-alquimista (Tao Kiao) e a fase religiosa (Ching Kia).A respeito da fase religiosa, já foi explicado anteriormente que ela surgiu como conseqüência da influência budista sobre a cultura chinesa.A fase mágica-alquimista foi a mais pobre e a mais extensa das fases do taoísmo, fundamentando seus dogmas na crença da possibilidade de imortalidade e na fábula da existência de uma erva que a concretizaria. A erva da imortalidade (Ling Chi Tsao) e a busca dos gênios imortais (Hsien) foi a preocupação maior e a razão máxima que motivou grande parte dos filósofos taoístas nessa fase. Quanto à fase filosófica, sua base apóia-se na obra “Tao Te Ching”, de Lao Tsu (604-517 a.C.).
Nessa obra de grande profundidade e de difícil interpretação o fráter tem a mesma oportunidade de encontrar uma das mais sensíveis contribuições do pensamento chinês. Já foi traduzida para o português e existem pelo menos 12 traduções diferentes ao alcance do público brasileiro nas boas livrarias. Essa obra contém muitos ensinamentos que incentivam a meditação, a busca interior e as técnicas respiratórias (mais tarde adotadas no Tai Chi Chuan).
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